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                                    Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 70, n. 110, p. 259-303, jul./dez. 2024286e valorativos do julgador. Em vez de promover uma uniformização racional do Direito ou ampliar o controle dos padrões decisórios, o sistema tende à cristalização dos mesmos padrões pré-existentes, reforçando suas idiossincrasias. Trata-se, pois, de uma reiteração algorítmica dos limites humanos, com todos os riscos de discriminação implícita e bloqueio da evolução jurisprudencial.Do ponto de vista técnico, a utilização de modelos de linguagem (LLMs) em ambientes jurisdicionais exige um debate mais profundo sobre seus fundamentos epistemológicos, sua auditabilidade, seus limites explicativos e sua abertura para o contraditório. O uso de estruturas do tipo “black box” pode violar o dever de fundamentação das decisões judiciais (art. 93, IX, CF), além de comprometer o princípio do devido processo legal substancial.Não obstante esses riscos, há também uma potência emancipatória: se implementados de forma transparente, com participação pública, pluralidade de dados e mecanismos de controle, os sistemas inteligentes podem oferecer sugestões alternativas de decisão, realizar análises comparativas e servir como instrumentos de “debiasing” - auxiliando o julgador a tomar consciência de seus próprios padrões e ampliando a dialogicidade processual.6.1 Vieses algoritmosEstá na ordem do dia o debate a respeito do uso da inteligência artificial no processo. As vantagens dizem respeito ao custo, à agilidade - rectius: instantaneidade - segurança jurídica e à redução da subjetividade do decisionismo e do ativismo judicial.Esses fatores acima apontados, realmente, são muito atraentes, mas é importante fazer algumas ponderações e entender a utilidade da ideia de heterogeneidade no processo judicial eletrônico.A sociedade vem a cada dia se tornando mais polarizada. Não há consenso ainda, mas há estudos indicando que essa polarização é um efeito estrutural da arquitetura das redes sociais40. Nessa linha, a polarização vem contaminando também o Poder Judiciário, o que aumenta o grau de insegurança jurídica e até mesmo de desconfiança no que diz respeito à neutralidade dos juízes.40 Sustein (1998), Conover (2011), Bradey (2018). Em sentido contrário: Boxel, 2017.
                                
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