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48Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 70, n. 110, p. 37-62, jul./dez. 2024Ora, como acima se referiu, as apps, ao permitirem novas formas de prestar serviços, colocando em contacto a oferta e a procura, representam, sem dúvida, um dos desafios emergentes para o Direito do Trabalho. Afinal, os serviços fornecidos via apps, sejam serviços de transporte efetuados por um motorista, sejam serviços de entrega ao domicílio efetuados por um estafeta (só para darmos estes dois exemplos, frequentes nos nossos dias), relevam para o Direito do Trabalho, situando-se dentro das fronteiras deste ramo do ordenamento? Ou, pelo contrário, quem presta tais serviços são trabalhadores independentes, são, quiçá, microempresários, cuja atividade já está para além das fronteiras do direito laboral?É claro que qualificar o trabalho em plataformas, o trabalho realizado com recurso a apps, como autónomo ou dependente sempre dependerá de uma apreciação casuística, que leve em conta os dados resultantes de cada tipo de relação, de cada concreto contrato. E também é claro que estas novas formas de prestar serviços levantam consideráveis dificuldades de enquadramento, até porque, infelizmente, não dispomos de um qualquer “subordinómetro” que nos forneça uma resposta infalível e irrefutável. Não espanta, por isso, que os tribunais, um pouco por toda a parte, se tenham confrontado com esta questão, chegando a resultados nem sempre coincidentes. Vejamos dois exemplos, relevantes em si, pelo seu conteúdo e pela entidade que decide, mas também por serem bastante recentes.3.2. A Glovo e o Supremo Tribunal espanholRecentemente, na vizinha Espanha, o Tribunal Supremo proferiu uma decisão especialmente importante a este respeito, versando sobre o estatuto de um rider/estafeta da Glovo. Uma sentença paradigmática, proferida em 25 de setembro de 2020, do Tribunal Supremo, Sala Cuarta,de lo Social, Sentencia 805/2020, no Rec. 4746/2019. Esta decisão configura, ademais, um acórdão de unificação da doutrina e, por isso, cremos que se justifica divulgá-la. Ora, o Supremo Tribunal espanhol reconheceu a existência, in casu, de uma relação de emprego, de uma relação de trabalho dependente e subordinado, entre o rider e a Glovo. Em síntese, o tribunal afirmou que:i) A Glovo não é uma mera intermediária na contratação de serviços entre estabelecimentos comerciais e estafetas; não se limita a prestar um serviço eletrónico de intermediação, consistente

