Page 176 - REVISTA DO TRT3 Nº 101
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          compreensão mais abrangente do fenômeno. No entanto, por outro lado,
          há ainda um longo caminho a ser percorrido até que representações e
          exigências  equivocadas  a  respeito  do  comportamento  das  mulheres
          assediadas sejam revistas.

               IV CONSIDERAÇÕES FINAIS


               O  presente  artigo  objetivou  descortinar  a  violência  de  gênero
          presente no assédio sexual, principalmente no ambiente de trabalho,
          a fim de fornecer elementos para uma compreensão mais abrangente
          do fenômeno. Em nosso percurso, constatamos que há certa dificuldade
          para  comparar  dados,  uma  vez  que  os  critérios  de  pesquisa  não  são
          homogêneos e faltam estudos que avaliem o discurso utilizado na prática
          pelos tribunais.
               A legislação brasileira trata o tema de modo incompleto, havendo
          diferenças marcantes entre o entendimento gerado a partir da tipificação
          penal  e  aquele  predominante  na  seara  trabalhista,  dando  margem  a
          inúmeras dúvidas e divergências interpretativas. No geral, os tribunais
          trabalhistas têm avançado na compreensão de que a definição constante
          na lei penal é insuficiente para balizar o assédio na seara do direito do
          trabalho, e têm caminhado para uma definição ampla do assédio sexual
          no ambiente laboral, aumentando a proteção garantida às vítimas que
          procuram a Justiça do Trabalho para reconhecimento das situações de
          violência e dano que sofreram.
               Por  outro  lado,  constatamos  que  prevalecem  ainda,  em  alguns
          julgados,  representações  sobre  papéis  femininos,  exigências  não
          razoáveis de prova da oposição e de não consentimento, em um contexto
          de justificável temor de perda do emprego, de represálias e até mesmo
          de inversão da situação, com a recriminação e a culpabilização social
          da  vítima.  Outros  minimizam  e  naturalizam  as  condutas  praticadas.
          Constata-se,  ainda,  a  exigência  de  prova  do  ato  em  si,  quando  ele  é
          realizado, quase sempre, na ausência de testemunhas.
               Felizmente,  todavia,  existem  julgados  que  percebem  o  viés  de
          gênero e asseguram o respeito à dignidade da mulher. Tais manifestações
          reforçam o compromisso da justiça trabalhista, em um percurso lento,
          porém contínuo, com a conscientização das questões de desigualdade,




                Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 151-182, jan./jun. 2020
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