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Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 70, n. 110, p. 139-150, jul./dez. 2024141A hipótese que se defende é a de que, embora seja positiva a iniciativa do Poder Judiciário em desenvolver suas próprias ferramentas de IA, esta não deve ser a prioridade, nem deve obstar o uso livre de sistemas de IA por parte dos magistrados, inclusive aqueles desenvolvidos pela iniciativa privada. Argumenta-se que a concorrência inerente ao setor privado fomenta o aprimoramento rápido e a qualidade das soluções, tornando-as, em muitos casos, superiores às desenvolvidas internamente por instituições. Nesse sentido, teceremos uma crítica às normas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que, ao desestimular o desenvolvimento paralelo (Resolução CNJ nº 615/2025) ou anteriormente vedá-lo (Resolução CNJ nº 332/2020, revogada), podem, paradoxalmente, frear a inovação e o acesso às melhores ferramentas. A prioridade, então, recai sobre a capacitação e o aprimoramento contínuo do magistrado, que, munido de sua experiência e preparo técnico-jurídico, atua como o filtro ético indispensável para compreender, usar e fiscalizar o uso e os resultados da IA, assegurando a prudência e a justiça nas decisões.Foi adotada a linha jurídico-teórica de pesquisa, com a abordagem dos aspectos conceitual e prático do tema, bem como do método de investigação hipotético-dedutivo, com a revisão de bibliografia especializada e de normas jurídicas pertinentes ao tema, tanto nacionais quanto internacionais, buscando demonstrar que o preparo do juiz é a garantia fundamental para a aplicação ética e responsável da IA no processo decisório.2 O DEBATE SOBRE A SUBSTITUIÇÃO HUMANA E O JUIZ NATURALA discussão sobre a substituição do magistrado pela inteligência artificial não é meramente técnica, mas fundamentalmente ética, versando sobre o dever ser. Para além da capacidade tecnológica, indagase se é desejável que a IA assuma integralmente a função jurisdicional, considerando os custos econômicos, a conveniência política e, sobretudo, o impacto social. Este ponto se conecta diretamente à concepção do juiz natural1, que, no contexto atual, deve ser um juiz humano, previamente investido e com competência estabelecida antes do fato a ser julgado.1 Esse princípio está previsto, por exemplo, no art. 5º, XXXVII e LIII, da CF; no art. 14, item 1, do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (PIDCP) - Decreto nº 592/1992; e art. 8º, item 1, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica) - Decreto nº 678/1992.

