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67Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 70, n. 110, p. 65-96, jul./dez. 2024Assim, este texto será realmente novo apenas a partir daí.Vamos, então, ao texto em que me plagiei.OS DOIS LADOS DA JUSTIÇAHá uma Justiça com “J” e uma justiça com “j”. A primeira nos remete ao órgão que julga as nossas ações. A segunda, ao teor do próprio julgamento.Desde tempos remotos, as duas palavras viveram, quase sempre, muito próximas - pelo menos no imaginário coletivo. Mesmo quando ainda invocavam os deuses para resolver os conflitos, as pessoas provavelmente entendiam que a solução dada por aquela espécie de Justiça refletiria o seu ideal de justiça.É verdade, como sabemos, que os conceitos de justo e injusto podem variar no espaço e no tempo. Ainda assim, ou por isso mesmo, dentro de um certo tempo e um certo espaço sempre nos esforçamos para distingui-los. Além disso, ambas as ideias parecem ter um núcleo duro, pouco afetado pela geografia ou pela história: as ações de matar ou de furtar, por exemplo, tendem a ser rejeitadas, seja qual for a época ou o lugar, salvo poucas exceções; já as de socorrer um faminto ou cuidar bem dos filhos costumam ser celebradas. E creio que se possa acreditar numa evolução natural do pensamento humano, ainda que o próprio conceito de evolução possa ser às vezes discutível. Basta pensar, por exemplo, que há não muitos séculos as pessoas com deficiência eram atração de circos ou zoológicos; ou, em sentido oposto, observar a história recente das conquistas feministas e de tantas minorias.Seja como for, sempre que se fala em justiça ou em Justiça é preciso separar a ideologia da realidade, e relativizar os conceitos. A ideologia nos faz pensar, por exemplo, que pode haver uma justiça real, inteira, nas atuais relações de trabalho, fazendo-nos esquecer de que o sistema em que vivemos divide as pessoas e (em certa medida) até os países em duas metades: os que têm e os que não têm os meios de produção. E essa realidade interfere em tudo, inclusive no sentido que o trabalho tem para o trabalhador. Mas o fato é que pagar os salários em dia não significa completamente ser justo. Do mesmo modo, a ideologia nos leva a crer que a Justiça, desde que conte com um juiz honesto, será sempre neutra, imparcial e democrática; e, no entanto, há todo um aparato - simbólico e real - que a cada momento desmente (pelo menos em parte) essas ideias.

