Page 138 - REVISTA DO TRT3 Nº 101
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          principais  papéis  de  novela,  e  uma  figurinista.  No  caso  do  assédio
          moral que despontou no início de 2020 na mesma emissora, estavam
          envolvidos  o  líder  de  projetos  humorísticos  da  Rede  Globo,  Marcius
          Melhem e diversos subordinados diretos.
               Independente do país de origem, verifica-se um ponto em comum
          entre os casos de assédio que eclodem no meio artístico em geral, isto
          é, a verticalização entre assediador e assediado. Os casos de assédio
          moral e sexual geralmente envolvem atores, diretores e demais pessoas
          com grande poder diretivo e decisório em face de homens e mulheres
          em funções comumente consideradas inferiores, que são secundárias
          à  produção,  tais  como  estagiários(as),  maquiadores(as),  figurinistas,
          jovens atores/atrizes, coadjuvantes, auxiliares e demais subalternos.
               O  assédio  vertical  descendente  é  a  espécie  mais  recorrente
          no meio laboral. Ele ocorre quando é realizado de cima para baixo,
          ou seja, por um responsável hierárquico que abusa de seu poder de
          direção e comando. Geralmente o superior hierárquico se prevalece
          de seu poder de forma desmedida e arcaica, tendo como objetivo
          reduzir a influência de um empregado junto àqueles que estão ao seu
          redor,  sendo  resultado  da  assimetria  e  do  desequilíbrio  das  forças
          laborais.
               Além da verticalização entre assediador e assediado, na maioria
          dos casos, também se vislumbra uma internalização da conduta, isto é,
          o assédio é visto pelo assediador, pelo assediado e pelas testemunhas
          como  algo  normal,  intrínseco  ao  próprio  meio  artístico.  A  cultura
          do  assédio  no  mundo  das  celebridades  e  artistas  pode  ter  sido  um
          fator determinante para a demora na exposição dos assediadores e
          publicação de muitos episódios, que só vieram à tona nos últimos 4
          anos.
               Grande  parte  das  vítimas  do  produtor  hollywoodiano  Harvey
          Weinstein acreditam que o assédio sexual era “natural” no meio em que
          trabalhavam, algo “costumeiro” e “até necessário” para atingirem uma
          finalidade,  sendo  que  a  recusa  dos  favores  sexuais  poderia  acarretar
          sérios prejuízos à carreira, ou até mesmo o fim definitivo de uma possível
          ascensão profissional.
               A natureza do assédio moral e sexual estava tão arraigada no meio
          artístico, que, apesar de inúmeras testemunhas presenciarem situações


                Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 131-149, jan./jun. 2020
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