Page 185 - REVISTA DO TRT3 Nº 101
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               da  pessoa  humana  na  sociedade  com  as  diversas  estruturas  de  poder,
               considerando sua raça, classe e gênero. Trata-se, pois, de uma consequência
               de diferentes modos de dominação e/ou de discriminação; do visualizar das
               formas de subordinação: sexismo, racismo, classismo, patriarcalismo.
                    A Teoria da Interseccionalidade (CRENSHAW, 1991; HILL COLLINS,
               2016) observa que o trabalho doméstico é moldado por e é reprodutor
               de  desigualdades  interseccionadas  de  gênero,  raça  e  classe.  A  ideia
               de  que  tarefas  domésticas  são  uma  extensão  da  natureza  feminina,
               fruto  da  divisão  sexual  do  trabalho,  inferioriza  as  mulheres,  delimita
               sua  sociabilização  e  inviabiliza  a  igualdade  de  gênero  no  mercado
               de  trabalho  (SANTOS,  2019,  p.  120).  Tal  limitação  desnuda,  ainda,
               questões raciais: a realização do trabalho por mulheres negras e pobres
               acentua  desigualdades,  uma  vez  que  se  trata  de  tarefas  sociais  e
               monetariamente desvalorizadas, cujas condições de trabalho oferecem
               poucas possibilidades de ascensão social e sociabilização.
                    Exatamente  por  serem  consideradas  femininas  as  tarefas
               domésticas  e  de  cuidado,  relacionadas  à  reprodução  da  vida,  é  que
               os  empregos  domésticos  são  ocupados,  em  sua  maioria  absoluta,  por
               mulheres (TOLEDO, 2008, p. 66). Desse modo, a divisão sexual do trabalho
               reserva a elas o trabalho reprodutivo , a ser realizado na esfera privada. A
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               predominância de mulheres negras no setor tem relação com o legado da
               escravidão, já que, após sua abolição, os serviços de menor complexidade
               que  dependiam  sobretudo  de  força  física  eram  tipicamente  “coisa  de
               negro”, e sua simplicidade justificava as menores remunerações.
                    Nessa  linha,  o  segundo  elemento-chave  a  ser  examinado  é  a
               discriminação,  em  especial  aquela  relegada  à  negritude:  histórica  e
               da  qual  ainda  restam  evidentes  resquícios  na  contemporaneidade.



               2    O trabalho reprodutivo ou trabalho da reprodução se refere tanto ao trabalho necessário para a
                 reprodução humana realizado pelas mulheres (gravidez, parto ou amamentação), como ao conjunto
                 de atenções e cuidados necessários para o sustento da vida e a sobrevivência humana: alimentação,
                 cuidados físicos e sanitários, educação, relações sociais, apoio afetivo e psicológico ou manutenção
                 dos espaços e bens domésticos. Em contraposição, fala-se em trabalho produtivo para aquele que é
                 desenvolvido no mercado de trabalho. Certo é que a divisão sexual do trabalho reflete o fato que a
                 maioria dos homens exerce suas atividades no mercado de trabalho capitalista (o chamado “trabalho
                 produtivo”), e as mulheres dividem seu tempo “naturalmente” entre a produção de mercadorias
                 fora de casa e a realização das tarefas domésticas relativas aos cuidados da família (o dito “trabalho
                 reprodutivo”). “O trabalho reprodutivo tem um grande significado para o bem-estar do ser humano.
                 Porém, como não tem caráter mercantil, é ignorado pelas ciências econômicas e desvalorizado pela
                 sociedade, que dele depende para se reproduzir. Assim, a divisão sexual do trabalho está no cerne da
                 argumentação do pensamento feminista sobre as diferenças entre o papel feminino e o masculino.”
                 (MELO; CASTILHO, 2009, p. 03).


                     Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 183-215, jan./jun. 2020
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