Page 188 - REVISTA DO TRT3 Nº 101
P. 188
188
de qualificação, salários e até mesmo de reconhecimento. Estatísticas
comprovam essa afirmação, demonstrando que a participação das
mulheres supera a dos homens em algumas profissões culturalmente
identificadas como “femininas” e associadas a menores salários.
Prova disso é a disparidade na categoria dos empregos domésticos:
92,3% deles são ocupados por mulheres (IBGE, 2018, p. 16).
Tal disparidade guarda peculiar espaço na história brasileira, visto
que a atividade em análise reproduz os resquícios de uma época colonial,
em que serviços domésticos eram interpretados como trabalho escravo,
desempenhado por mulheres negras. Não é à toa que a composição atual
3
de trabalhadoras domésticas permanece a mesma: pesquisa realizada
no ano de 2016 pelo Ministério do Trabalho e Previdência Social (MTPS)
e Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) constatou que
Nas moradias das classes média e alta, a realização do
trabalho doméstico é quase exclusivamente feminina:
92% dos empregados domésticos são mulheres, e
essa é a ocupação de 5,9 milhões de brasileiras, o
equivalente a 14% do total das ocupadas no Brasil
(PORTAL BRASIL, 2016, p. 07).
Observa-se que, no Brasil, o vínculo empregatício doméstico dá uma
continuidade atualizada à tradição escravocrata, já que as mulheres negras
“[...] são maioria [dentre as domésticas], têm escolaridade menor e ganham
menos.” (PORTAL BRASIL, 2016, p. 08). Em 2014, apenas 10% das mulheres
brancas exerciam essa profissão (PORTAL BRASIL, 2016, p. 08). Destaca-se:
O trabalho doméstico é geralmente ocupado por
mulheres negras, que representam 52,6% das
3 Opta-se pelo termo escravizado ao imputar às pessoas, uma vez que escravo remete à produção de
uma identidade fixa, como se fosse algo inerente à pessoa humana (o que não é). “Escravo conduz ao
efeito de sentido de naturalização e de acomodação psicológica e social à situação, além de evocar uma
condição de cativo que, hoje, parece ser intrínseca ao fato de a pessoa ser negra, sendo desconhecida
ou tendo-se apagado do imaginário e das ressonâncias sociais e ideológicas a catividade dos eslavos
por povos germânicos, registrada na etimologia do termo.” (TAILLE; SANTOS, 2012, p. 08). Por outro
lado, o termo escravizado revela a contingência cruel da vida de uma pessoa, a qual foi a ela imposta,
reconhecendo-o como sujeito de uma história social. “Já os usos contemporâneos que têm sido feitos
do vocábulo escravizado para se referir à escravidão negra parecem ter como propósito resgatar
o contexto e a relação histórico-social referente ao período escravocrata, evocando ressonâncias
semânticas do pressuposto de responsabilização e de opressão pelo processo de escravidão.” (TAILLE;
SANTOS, 2012, p. 08).
Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 183-215, jan./jun. 2020