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310Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 70, n. 110, p. 307-326, jul./dez. 2024A real tensão reside na admissibilidade de normas coletivas in pejus, capazes de limitar ou afastar direitos trabalhistas previstos em lei. Ainda que se admita tal possibilidade em determinadas hipóteses, não se pode aceitar que essa seja a tônica do sistema, nem tampouco o eixo central de uma jurisprudência da Corte constitucional.Como bem advertiu Mozart Victor Russomano,[...] é a favor do trabalhador que o Estado admitiu a negociação coletiva e, dentro das realidades trabalhistas, a progressiva ascensão do seu standard de vida constitui a mola principal que põe em movimento o vasto e complexo mecanismo do Direito do Trabalho2.Pensar que a negociação coletiva deva ser compreendida, prioritariamente, como instrumento de renúncia ou contenção de direitos, não apenas subverte esse vetor histórico, como revela o espanto de existir uma tese vinculante para sustentar algo que deveria ser excepcionalíssimo.O observador atento do Direito do Trabalho, em evolução desde a primeira revolução industrial, deve ser capaz de superar a interpretação literal do enunciado da tese estabelecida a partir do ARE nº 1121633, pois sabe ser insuficiente a mera afirmação da necessidade de respeito aos direitos absolutamente indisponíveis.A tese que se pretende demonstrar a seguir orienta-se pela compreensão de que o Direito do Trabalho legislado - isto é, fundado nas normas heterônomas estatais - não se restringe a estabelecer limites ao Direito do Trabalho negociado, fruto das normas coletivamente estipuladas, mas sim desempenha muitas outras funções, a seguir delineadas.A constatação da múltipla importância das normas estatais não pretende negar a importância das normas autônomas. Pelo contrário, o Direito do Trabalho negociado pelos entes coletivos é a representação máxima da democratização da sociedade e, por isso, deve ser valorizado.Entretanto, como advertiu Umberto Romagnoli, não há uma luta maniqueísta entre a lei e a negociação coletiva sob a forma de um embate impiedoso entre a autoridade e a liberdade, entre um Estado paternalista e intrusivo e uma sociedade civil supostamente autônoma e emancipada. 2 RUSSOMANO, Mozart Victor. Princípios gerais de direito sindical. 2. ed. São Paulo: LTr, 1995, p. 165.

