Page 53 - Demo
P. 53
53Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 70, n. 110, p. 37-62, jul./dez. 2024indicadas pela Uber - os motoristas fornecem, afinal, a mão-de-obra de que a Uber necessita para explorar o seu próprio negócio.8Vale a pena recapitular o essencial da argumentação expendida, in casu, pelo SupremeCourt: a remuneração paga aos motoristas pelo trabalho é fixada pela Uber e os motoristas não têm qualquer palavra a dizer quanto a isto (salvo, claro, ao decidirem quando trabalhar e quanto trabalham prestam); as condições contratuais ao abrigo das quais os motoristas prestam os seus serviços são ditadas pela Uber; muito embora os motoristas tenham, em abstrato, liberdade para escolher quando trabalham, a verdade é que, a partir do momento em que um motorista se conecte, através da app da Uber, a sua margem de liberdade efetiva quanto à aceitação dos pedidos de transporte encontra-se, de facto, muito condicionada pela Uber; a Uber exerce um controlo muito significativo sobre a forma como os motoristas executam os seus serviços (através da tecnologia utilizada e, bem assim, através dos sistemas de avaliação da performance do motorista, que podem, no limite, levar à sua “desativação”); a Uber restringe a comunicação entre o passageiro e o motorista ao mínimo indispensável para realizar o serviço de transporte em causa e toma medidas ativas em ordem a impedir os motoristas de estabelecerem qualquer relação com o passageiro que possa estender-se para além daquela concreta corrida. Assim sendo, o Supreme Court conclui:Ponderando estes fatores conjuntamente, pode ver-se que o serviço de transporte realizado pelos motoristas e oferecido aos passageiros através da app da Uber é definido e controlado, em moldes muito estritos, pela Uber. Além disso, o mesmo é concebido e organizado de forma a providenciar um serviço estandardizado aos passageiros, no qual os motoristas são tidos como substancialmente fungíveis (“interchangeable”) e do qual a Uber, e não os concretos motoristas, desfruta dos benefícios da lealdade e “goodwill” dos clientes. Vistas as coisas da perspetiva dos motoristas, esses mesmos fatores - em particular, a impossibilidade de oferecer um serviço distinto ou de estabelecer o preço dos serviços e o controlo da Uber sobre todos os aspetos da sua interação com os passageiros - significam que 8 Este caso agora decidido, em defi nitivo, pelo Supreme Court, foi objeto de uma primeira sentença do Employment Tribunal de Londres, proferida em 28 de outubro de 2016. Sobre esta decisão, vd. o comentário de João Leal Amado e Catarina Gomes Santos, “A Uber e os seus motoristas em Londres: mind the gap!”, Revista de Legislação e de Jurisprudência, n.º 4001, Nov.-Dez. de 2016, pp. 111-127.

