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                                    54Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 70, n. 110, p. 37-62, jul./dez. 2024eles têm pouca ou nenhuma capacidade para melhorar a sua posição económica através de qualquer “skill” profissional ou empresarial. Na prática, a única forma através da qual eles podem aumentar os seus rendimentos consiste em trabalhar mais horas, sempre correspondendo aos padrões de performance fixados e exigidos pela Uber. (§ 101, tradução nossa).Em suma, no caso em apreço o tribunal não teve dúvidas de que os motoristas da Uber eram workers e não genuínos independent contractors. Aqueles estão, em relação à Uber, numa situação de subordinação ou, ao menos, de “parasubordinação”, prestando trabalho para esta empresa numa posição de acentuada dependência económica. Employee ou worker, o certo é que, para o Supremo Tribunal, os motoristas da Uber não são selfemployed independent contractors. Tanto basta para que as leis do trabalho, em matéria de jornada e de salário, lhes sejam aplicáveis. E, acrescenta o tribunal, não há manobras de engenharia jurídica, efetuadas por argutos advogados, que possam obstar a tal aplicação.Eis, a nosso ver, a grande lição a retirar desta importante sentença. É que, por vezes, vai uma grande distância entre a engenharia contratual (e o imaginativo emaranhado terminológico adrede utilizado) e a realidade relacional. Nem partner nem customer, o driver é, afinal, vistas as coisas como elas são, um worker da Uber.93.4. O Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho e o trabalho nas plataformas digitaisA este propósito, importa concluir com uma nota otimista. O LivroVerde sobre o Futuro do Trabalho, a que já acima se fez referência, traça, nesta matéria, uma linha de rumo promissora, na qual nos revemos. Com efeito, nele pode ler-se, como uma das linhas de reflexão para as políticas públicas em matéria de plataformas digitais:9 Para maiores desenvolvimentos, João Leal Amado e Teresa Coelho Moreira, “A Uber, o motorista e o cliente: três ou quatro? A propósito de uma decisão do Supreme Court do Reino Unido”, Revista Internacional de Direito do Trabalho, n.º 2, 2021 (no prelo). Em Portugal, não havendo jurisprudência, o certo é que já dispomos de uma “lei Uber”, a Lei n.º 45/2018, de 10 de agosto, a lei do TVDE (transporte individual remunerado de passageiros em veículo descaracterizado), diploma que, todavia, obriga a constituir um novo ente neste domínio, a mais do operador de plataforma eletrónica, do motorista e do cliente - o chamado “operador de TVDE”, cujo préstimo e função são muitíssimo duvidosos.
                                
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