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                                    Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 70, n. 110, p. 151-170, jul./dez. 2024167Pode-se extrair desse processo histórico-dialético três premissas centrais: (i) a tecnologia serve à efetividade dos direitos fundamentais, (ii) afeta, mas não compromete, a independência judicial dos magistrados e (iii) pode ser imposta aos órgãos judiciários e seus agentes em prol do interesse público.Nesse contexto evolutivo, a inteligência artificial representa apenas a etapa mais recente de inovação tecnológica a ser incorporada para a modernização do direito processual.Ferramentas de inteligência artificial para triagem de peças, jurimetria, recomendação de precedentes - e até mesmo para elaboração de minutas de decisão - ampliam de forma exponencial a capacidade analítica dos tribunais.Tais ferramentas não cerceiam a liberdade do magistrado de formar seu convencimento ou decidir o mérito das causas e tampouco lhes retiram os deveres funcionais de zelar pela qualidade da prestação jurisdicional, mas trazem novas potencialidades na esfera procedimental, garantindo que o magistrado possa utilizar os meios mais eficazes disponíveis para concretizar os direitos das partes.Portanto, pode-se afirmar que os magistrados têm o dever jurídico-funcional de - ainda que possam fundamentadamente avaliar pela conveniência e oportunidade de utilizá-las ou não em cada caso concreto - aderir e se qualificar para o uso às soluções tecnológicas institucionalmente postas à sua disposição.O uso de ferramentas tecnológicas não decorre de fetichismo decorrente de um suposto triunfalismo tecnológico ou capricho administrativo, mas um meio apto e eficaz para realizar a justiça em sintonia com o devido processo legal e os direitos dos litigantes à tutela jurisdicional tempestiva e efetiva.Desse modo, a recusa injustificada à adoção das ferramentas de inteligência artificial regulamentadas pode configurar infração ética (arts. 29-32 do Código de Ética da Magistratura), administrativa (Resolução 615/2025 do CNJ) e constitucional (art. 5º, LXXVIII c/c art. 37, caput), por vulnerar o direito das partes a um processo justo, célere e eficiente, utilizando o melhor estado da técnica para otimização da prestação jurisdicional.Conclui-se, assim, que a magistratura brasileira deve posicionar-se como protagonista lúcido da transformação digital, utilizando as ferramentas de inteligência artificial com senso crítico, supervisão humana qualificada e respeito absoluto às garantias processuais.
                                
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