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Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 70, n. 110, p. 171-187, jul./dez. 2024172Keywords: Artificial Intelligence; algorithmic subordination; Judiciary; transparency; fundamental rights.1 INTRODUÇÃOA inteligência artificial (IA) deixou de ser uma promessa futurista para se tornar uma realidade concreta em diversas esferas da sociedade, incluindo o sistema judiciário. Desde ferramentas simples de consulta e elaboração de peças, como o ChatGPT, até sofisticados sistemas de triagem processual e análise preditiva, a IA tem sido progressivamente incorporada ao cotidiano do Direito. Contudo, a adoção dessa tecnologia no ambiente jurídico suscita preocupações éticas, jurídicas e sociais que não podem ser ignoradas.As recentes decisões do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-3) demonstram como a IA já impacta diretamente a sociedade e o Direito. Nos julgados que tratam da chamada “subordinação algorítmica” em plataformas digitais, o Judiciário reconhece que os algoritmos não apenas gerenciam atividades econômicas, mas também exercem controle sobre trabalhadores, moldando relações jurídicas de maneira invisível e automatizada. Esse fenômeno revela que a IA, quando desprovida de transparência e de controle humano adequado, pode gerar efeitos jurídicos relevantes, inclusive lesivos aos direitos fundamentais.Por outro lado, ao mesmo tempo em que o Judiciário analisa os impactos da IA nas relações sociais, ele próprio começa a se valer de ferramentas algorítmicas para otimizar sua atuação. Essa transição do papel tradicional do juiz para o apoio ou mesmo a substituição parcial por sistemas de inteligência artificial exige um exame criterioso, especialmente à luz dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, do devido processo legal, da motivação das decisões judiciais e da proteção da privacidade.Este artigo parte da análise de resoluções, trabalhos acadêmicos, artigos, jurisprudência recente do TRT-3 e de experiências internacionais, como o uso de sistemas de reconhecimento facial em larga escala na China, para problematizar os riscos e desafios da implementação da IA no sistema judiciário brasileiro. Busca-se demonstrar que a eficiência não pode se sobrepor aos direitos fundamentais e que a transparência, a explicabilidade e a responsabilidade humana continuam sendo exigências irrenunciáveis em um Estado Democrático de Direito.

