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Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 70, n. 110, p. 535-734, jul./dez. 2024667A gamificação, amplamente utilizada em plataformas digitais como a Uber, representa uma técnica inovadora que associa elementos de jogos, como metas, pontuações, recompensas e níveis de desempenho, para engajar motoristas parceiros e moldar seus comportamentos. Apesar de sua aparência lúdica e motivacional, a gamificação frequentemente opera como uma ferramenta de controle e gestão indireta, configurando o que se denomina subordinação algorítmica.Na prática, a subordinação algorítmica ocorre quando as diretrizes sobre o modo de execução do trabalho, metas e padrões são estabelecidas e aplicadas por meio de algoritmos, substituindo a figura tradicional de um supervisor humano. No caso da Uber, os motoristas são constantemente monitorados por métricas que avaliam sua produtividade e qualidade de serviço, como índices de aceitação de corridas, taxas de cancelamento e avaliações atribuídas pelos clientes. Esses indicadores não apenas determinam as oportunidades de ganhos, mas também influenciam decisões automatizadas como bloqueios ou suspensões de contas.A gamificação, nesse contexto, funciona como um mecanismo sofisticado para induzir comportamentos alinhados aos interesses da empresa, criando um ambiente competitivo e recompensador. Por exemplo, sistemas de prêmios e metas de corridas consecutivas promovem a disponibilidade contínua dos motoristas, mesmo em condições de trabalho adversas, como jornadas exaustivas ou horários de pico. Esses estímulos, ao combinarem aspectos lúdicos com consequências práticas, substituem ordens explícitas, mas mantêm o mesmo objetivo: exercer controle sobre o trabalhador.Esse modelo de gestão evidencia uma nova forma de subordinação, distinta da tradicional hierarquia vertical. A subordinação algorítmica, mesmo sem a presença física de um empregador ou ordens diretas, mantém os motoristas integrados à dinâmica organizacional da empresa e dependentes de sua lógica operacional. Assim, elementos como gamificação, monitoramento em tempo real e sistemas de avaliação estruturam um vínculo de dependência econômica e funcional, evidenciando as nuances da subordinação no âmbito digital.Portanto, a relação entre gamificação e subordinação algorítmica reflete a transformação das relações laborais na era das plataformas digitais, onde algoritmos e interfaces substituem formas tradicionais de comando, mas não eliminam os elementos de controle, fiscalização e imposição de padrões típicos da subordinação no direito do trabalho. Esse cenário suscita importantes reflexões jurídicas sobre os limites da autonomia e da liberdade do trabalhador no contexto das novas tecnologias.

