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Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 70, n. 110, p. 535-734, jul./dez. 2024672Embora a Ré alegue ausência de subordinação sob o argumento de que o Autor tinha liberdade para escolher quando, onde e como utilizaria o aplicativo, a realidade demonstrou o contrário. O controle sobre o trabalho do Autor era exercido por meio do algoritmo da plataforma, que monitorava seu desempenho, estabelecia metas, recompensava a assiduidade e até aplicava penalidades, como a suspensão temporária ou definitiva do cadastro em caso de baixa avaliação ou não atendimento a demandas específicas. Esse modelo caracteriza a chamada subordinação algorítmica, pela qual o controle e direção do tomador de serviços são exercidos de forma indireta, mas inequívoca.A alegação da Ré de que os valores eram pagos diretamente pelos usuários não afasta o caráter oneroso da relação. A divisão das receitas entre a Ré (25%) e o Autor (75%) evidencia, em essência, que o pagamento pelo trabalho realizado estava diretamente vinculado à atividade desempenhada pelo Autor, sendo a Ré beneficiária de parte do resultado econômico. Essa dinâmica demonstra a existência de uma contraprestação financeira pelo trabalho realizado, atendendo ao requisito da onerosidade.Embora a Ré tenha sustentado que o Autor trabalhava em dias variáveis e sem rotina pré-definida, os registros indicam que ele realizou 9.827 corridas ao longo do contrato (20/9/2017 a 9/9/2024), resultando em uma média de 3,8 corridas por dia. Esse volume de trabalho comprova a continuidade e regularidade na prestação dos serviços, descaracterizando eventual eventualidade e preenchendo o requisito da habitualidade.A possibilidade de substituição alegada pela Ré não se confirmou no plano fático. O cadastro na plataforma era individual e intransferível, sendo exigido o cumprimento de requisitos específicos pelo motorista. Ainda que o Autor tenha tido a iniciativa de se cadastrar junto à Ré, o vínculo não se descaracteriza, uma vez que a execução do trabalho era realizada de forma pessoal e inalienável, em benefício direto da Ré.Embora a Ré tenha qualificado a relação como autônoma, a realidade demonstrou que o Autor se encontrava inserido na dinâmica estrutural e organizacional da empresa, submetendo-se às regras, controle e padrões estabelecidos pelo aplicativo. A primazia da realidade, consagrada no art. 9º da CLT, impõe que a relação jurídica seja analisada com base nos fatos efetivamente praticados, independentemente da nomenclatura contratual atribuída pelas partes.A análise do conjunto probatório confirma a presença da nãoeventualidade, elemento essencial para a caracterização do vínculo empregatício, conforme previsto no art. 3º da CLT. Sob a ótica da teoria

