Page 155 - REVISTA DO TRT3 Nº 101
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Com o fim da escravidão formal e com a saída das mulheres brancas
de suas casas para ocupar espaços públicos, sobretudo nos ambientes de
trabalho, ocorreram inúmeras mudanças sociais; no entanto, o assédio
sexual seguiu cada passo das mulheres. No caso das mulheres negras,
elas permaneceram ocupando, em sua maioria, funções subalternas
e/ou de informalidade, que legitimam e naturalizam o sexismo, como
a de empregada doméstica. Como demonstra Nascimento (2019),
a legitimação da exploração sexual da mulher negra continua se
perpetuando com base em estereótipos sobre sua capacidade sexual,
a atração exercida pela sua cor e o fato de estar, geralmente, em uma
classe pobre e fazer parte, no imaginário social ainda reinante, de uma
raça “primitiva” e com maior pendor para a sexualidade.
Alemany (2009) informa que as definições de assédio sexual variam
muito de acordo com o país e sua cultura. Foram as feministas da Universidade
de Cornell, nos anos 70, que falaram pela primeira vez em sexual harassment
(assédio sexual). Catharine MackKinnon teria introduzido a questão do
assédio na doutrina legal, por meio do livro Sexual harassment of working
women. O conceito foi adotado também na Europa e, em 1987, a Comissão
Europeia publicou seu primeiro relatório sobre o tema, documento que
reconheceu a incompatibilidade entre assédio sexual e efetiva igualdade de
tratamento entre homens e mulheres, possibilitando, assim, a visibilidade
de um viés de gênero (OLIVEIRA, 2013).
No Brasil e no mundo, a questão do assédio nos espaços públicos
ganhou grande visibilidade a partir das redes sociais. A pesquisa Voz
nas Redes, feita em parceria pelo Instituto Avon e a Folks Netnográfica,
revelou que debates sobre as violências sofridas por mulheres se
intensificou no ambiente digital sobretudo entre os anos 2015 e 2017
(INSTITUTO AVON/FOLKS NETNOGRÁFICA, 2018). Outros dados que
impulsionaram as discussões foram as campanhas da organização
Think Olga, que, segundo definição encontrada em seu próprio site,
busca sensibilizar a sociedade para questões de gênero e intersecções.
A internet facilitou a troca de informações e a militância. Em 2013, a
ONG criou a campanha “chega de fiu fiu”, com ampla mobilização nas
redes sociais. Em 2015, foi a vez da campanha #primeiroassédio, para
demonstrar repúdio aos comentários de conotação sexual dirigidos a
uma menina de 12 anos que participou de um reality show de culinária.
Mulheres de todo o país foram instadas a utilizar a hashtag narrando
as circunstâncias nas quais sofreram seu primeiro assédio, o que levou
Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 151-182, jan./jun. 2020