Page 480 - REVISTA DO TRT3 Nº 101
P. 480
480
Veja, Excelência, que nem mesmo se está diante de
uma relação de trabalho autônomo entre o reclamante
e a reclamada, na medida em que os serviços de
transporte individual privado de passageiros, realizados
pelo motorista, foram prestados exclusivamente em
prol dos usuários do aplicativo. (peça de defesa, f. 493)
(destacou-se).
Alega a Ré que a relação é de parceria comercial (antepenúltimo
parágrafo, na peça de defesa, à f. 497).
O art. 114 da Constituição Federal, em seu inciso I, estabelece que
este órgão da Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar
“as ações oriundas da relação de trabalho.” Se a Ré alegasse uma relação
jurídica de trabalho autônomo, ainda que não empregatício, não haveria
dúvidas de que a competência seria deste órgão.
Não é o caso, porém, da afirmada relação comercial de parceria -
que afasta a própria possibilidade de se utilizar, neste caso, até mesmo a
chamada “teoria da asserção”, que permitiria a análise fundada na mera
cognição superficial das alegações das partes.
Afinal, a Constituição estabeleceu a competência dos órgãos
do Judiciário a partir da espécie de relação jurídica que mantenham,
entre si, sendo que, no caso do art. 114, inciso I, textualmente se
estabeleceu que a competência da Justiça do Trabalho abrange
as relações jurídicas de trabalho - independente da natureza das
pretensões que sejam formuladas pelas partes que integrem uma
relação de trabalho.
Quem classifica, juridicamente, a natureza dos fatos e relações que
ocorrem no mundo não são as partes, em sua liberdade de formulação
de pretensões e defesas, mas o povo, condensado no Estado enquanto
ordem jurídica. A ordem jurídica, porém, é abstrata e impessoal;
depende, como suporte, da análise do fato. E tal análise é o ofício do
operador da ciência jurídica (seja consultor, advogado ou juiz), com base
nos pressupostos concretos desta relação, ou seja, através da análise e
categorização dos suportes fáticos desta relação.
Por sua vez, a investigação do suporte fático da relação jurídica
entre Autor e Ré impõe a cognição profunda das provas por eles trazidas
a esta ação. Por esta razão, será realizada em cognição exauriente,
própria da análise do mérito.
Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 479-576, jan./jun. 2020