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Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 70, n. 110, p. 117-137, jul./dez. 2024127Complementa Gadamer, que “[...] o mistério da linguagem é a sua abertura. Qualquer um é capaz de encontrar a palavra correta para situações nunca calculáveis e para instantes imprevisíveis” (Gadamer, 2012, p. 37).Só ao ser de cultura, o ser livre, é dada a condição de permanentemente perquirir e conferir significação à vida, processo no qual “[...] a linguagem desempenha a função de uma síntese constante entre o horizonte do passado e do presente” (Gadamer, 2021b, p. 71). Trata-se, a um só tempo, de uma tarefa preditiva (ratificação de uma tradição) e “pósditiva” (coparticipação na orientação do sentido da história).Tratando-se de ação axiológica, e não estritamente lógica, afigura-se aqui uma fronteira ética para o uso de modelos de linguagem de larga escala (LLMs), em searas nas quais não se pode prescindir da expressão da intencionalidade moral humana através da linguagem, como é o caso da jurisdição. Nas palavras de Weizenbaum, “[...] o ser humano individual encontra-se em permanente estado de devir”, ao passo que “nenhum computador pode ser levado a enfrentar problemas humanos reais em termos humanos” (Weizenbaun, 1976, p. 240). “A Linguagem Humana tem a sua própria historicidade” (Gadamer, 2021b, p. 71), pelo que, diferentemente da linguagem de máquina, não parte de posições delimitadas (como uma determinada base de dados), e nem conta com evolução desenhada em receita algorítmica. “Tanto os conceitos, onde se movimenta o pensamento, quanto as palavras do uso cotidiano de nossa linguagem não estão dominados por uma regra rígida, com uma posição prefixada” (Gadamer, 2021b, p. 21).O logicismo linguístico e o behaviorismo já foram submetidos a uma elaborada crítica que marcou a filosofia da virada do século XX para o XXI, em resgate ao compromisso filosófico da linguagem com sua instância histórico-especulativa, a exemplo do que representou a própria Hermenêutica Gadameriana, para a qual não “[...] importa falar de um sentido puramente linguístico da interpretação gramatical, como se ela pudesse existir sem a interpretação psicológica” (Gadamer, 2021b, p. 23).Ocorre que, com o crescimento vertiginoso do uso de ferramentas substanciadas na deep learning para o processamento massivo da linguagem humana, as doutrinas agnósticas acerca da linguagem, assim consideradas aquelas que recusam a sua dimensão metafísica, acabam por merecer uma nova crítica.Obviamente, a ciência da computação não pôde buscar matriz de replicação maquinal do ser humano, a partir de matriz filosófica antropológico-fenomenológica, ou a partir de matriz linguística

