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                                    Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 70, n. 110, p. 117-137, jul./dez. 2024128compromissada com a historicidade humana, pela simples razão de a aceitação da ordem especulativa representar a própria aceitação dos limites lógicos das ciências duras, na qual se insere a matemática computacional.A expansão irrefletida dos nichos delegados à computação cognitiva faz com que cada vez mais o ser humano se posicione como mera extensão da maquinaria. Como bem adverte Russel, a questão atual é “[...] saber se o sistema de computadores continua a ser ferramentas para os humanos, ou se os humanos se transformaram em ferramenta para o sistema de computadores” (Russel, 2021, p. 128).Urge, assim, que retomemos a compreensão de que “[...] os problemas da qualidade de vida, dos fins éticos, dos valores de solidariedade e justiça são prioritários, e pressupostos necessários ao problema do desenvolvimento” (Lima Vaz, 1982, p. 25).É a vontade humana, um dado inerente à condição humana, que traça os limites (de-fine) do ser6, retirando o ser humano de seu mero estado de natureza. Essa vontade racional se mostra imprescindível à efetividade histórica do espírito, a se manifestar no mundo humano da cultura.A ação humana dirigida à efetividade histórica do ethos sempre demandará a sobreposição do exercício de uma vontade racional, uma inerência humana improgramável em modelos de linguagem de larga escala (LLMs). O esvaziamento do locus humano da linguagem, em prol de um locus mecânico, faz com que a própria condição humana sucumba àtecnocracia.No âmbito da educação, a UNESCO já advertiu, em seu último Relatório Global de Monitoramento da Educação, que “[...] ao simplificar o processo de obter respostas, essas ferramentas poderiam exercer um impacto negativo na motivação do estudante de conduzir pesquisas independentes e achar soluções” (UNESCO, 2023, p. 13). A conclusão do relatório da UNESCO converge com a advertência do ex-CEO da Google, no sentido de que a IA “[...] acelera as dinâmicas que corroem a razão humana à medida que possamos entendê-la: as mídias sociais, que diminuem os espaços para reflexão, e a pesquisa online, que diminui o ímpeto para a conceituação” (Schmidt, Huttenlocher, & Kissinger, 2023, p. 201). Enfim, “[...] o papel individual de revisar, testar e dar sentido à informação diminui. Em seu lugar entra o papel da IA, que se expande” (Schmidt; Huttenlocher; Kissinger, 2023, p. 202).6 “[O ser humano] se de-fine a cada instante (a cada instante em que quer ser ele próprio), se de-fine, isto é, põe um fim e põe limites entre o que ele quer e não quer ser” (Weil, 2012, p. 15).
                                
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