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                                    Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 70, n. 110, p. 367-533, jul./dez. 2024409plataforma não torna impossível o exame da natureza jurídica da relação de trabalho. O trabalhador autônomo exerce a sua atividade em proveito próprio e sem ingerência do tomador no modo em que o trabalho é realizado, controle ou fiscalização deste. Tem liberdade de auto-organização e assume os riscos do empreendimento, o que não é o caso dos autos. Convém destacar, nesse ponto, que assumir risco implica ter o benefício completo dos resultados, o que não ocorreu no presente caso, em que o autor somente arcou com os custos.Registra-se, ainda, que não é, tecnicamente, conditio sine qua non para que se reconheça a subordinação na relação laboral a pré-fixação ou vinculação do trabalhador a horário ou jornada pré-determinados. Para o empregador pode importar menos a fixação do horário em que deva ocorrer a prestação de serviços e mais a própria prestação de serviços sem horário estabelecido.Por fim, revela-se tecnicamente inapropriada a sustentação da negativa do vínculo empregatício no fato de que o autor tenha prestado serviços a terceiros. A única repercussão disso no contrato de trabalho refere-se à eventual quebra contratual, no caso de vedação, ao trabalhador, da prestação de serviços a outrem na vigência do contrato de trabalho. Diversamente, ratifica a possibilidade de duplo vínculo empregatício a prestação de serviços a terceiros no curso do contrato em não havendo cláusula proibitiva desta possibilidade. Ainda assim, estar-se-ia, em tese, diante de falta grave ensejadora de dispensa por justa causa, e não de descaracterização do vínculo de emprego nos casos em que este exista.Diante do acervo probatório dos autos, definitivamente é inaceitável o argumento de que o autor celebrou um contrato de parceria com a reclamada ou foi prestador de serviços autônomos.A atividade da demandada não se limita, de modo algum, a disponibilizar a plataforma digital de sua propriedade mediante pagamento de taxa. É ela quem dita as condições em que os serviços devem ser prestados, o preço do serviço, além de manter rígido e eficiente controle eletrônico da atividade laboral do motorista.É insustentável o argumento de que os preços dos serviços são determinados pela plataforma ou por uma ferramenta tecnológica (“tarifador”). A assertiva dá vida e capacidade decisória a tais dispositivos tecnológicos como se fossem independentes da vontade dos seus proprietários - no presente caso, a proprietária da plataforma. Os dispositivos de inteligência artificial e/ ou algoritmos ainda não chegaram a esse ponto na sua concorrência com os seres humanos.
                                
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