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               2015-A), que pode servir como base para punição de assédio em outros
               locais, porém com aplicação restrita.
                    Um exemplo bastante discutido na doutrina e na jurisprudência
               diz respeito ao assédio praticado por professor contra aluno, sendo de se
               destacar que recentemente a sexta turma do STJ entendeu configurado
               o assédio em uma relação deste tipo. 4
                    A segunda questão diz respeito à insuficiência da definição penal
               para enquadrar o assédio sexual em relação ao direito do trabalho, pois
               limita de modo indevido o espectro da violência, que pode ser praticada
               quando  se  está  em  um  mesmo  nível  hierárquico  no  que  diz  respeito
               ao trabalho, valendo-se, porém, de uma outra hierarquia presente em
               nossa  sociedade:  a  condição  de  homem  (DINIZ,  2015).  Desta  forma,
               trabalhadoras que sofrem com ofensas sexuais indesejadas de colegas
               de trabalho de mesma hierarquia estão desprotegidas pela lei penal, e,
               em certa medida, também pelo direito do trabalho, que permanece sem
               uma definição normativa do que é assédio sexual.
                    Embora  o  assédio  possa  partir  de  homens  e  mulheres  e  possa
               também atingir homens e mulheres, o que se observa na prática é uma
               dinâmica segundo a qual os homens ocupam com muito mais frequência
               o papel de assediadores, e as mulheres figuram como vítimas, em especial
               as negras.  A população LGBTQ+ também é considerada grupo vulnerável.
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               Nesse  sentido,  vale  observar  que  a  homofobia  está  profundamente
               ligada  à  misoginia;  homossexuais  masculinos  se  veem  discriminados
               sobretudo quando deixam de performar o ideal de masculinidade, ou
               seja, quando abrem mão de uma condição supostamente superior para
               se igualar às mulheres; mulheres lésbicas, por sua vez, são hostilizadas
               em razão sobretudo de ferirem, com sua recusa à heterossexualidade,
               o orgulho masculino, não sendo incomuns manifestações que tentam
               “corrigir” a orientação supostamente defeituosa de mulheres lésbicas
               (denominada comumente de estupro corretivo, quando assume caráter
               de  violência  sexual).  O  assédio,  desse  modo,  surge  como  mecanismo


               4    BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1759135/SP, Rel. Ministro Sebastião Reis
                 Júnior,  Rel.  p/  Acórdão  Ministro  Rogério  Schietti  Cruz.  Sexta  Turma.  Julgado  em  13.08.2019,
                 publicado DJe 01.10.2019.
               5    Em nossa pesquisa, deparamo-nos com o caso de uma mulher assediada sexualmente por outra.
                 O  relato  encontra-se  na  dissertação  de  mestrado  de  Mariluc  Stela  Passos  de  Souza,  intitulada
                 “Mulheres vítimas de assédio sexual: dez mulheres, dez histórias”. Universidade do Minho (Braga,
                 Portugal), outubro de 2018.


                     Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 151-182, jan./jun. 2020
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