Page 161 - REVISTA DO TRT3 Nº 101
P. 161
161
2015-A), que pode servir como base para punição de assédio em outros
locais, porém com aplicação restrita.
Um exemplo bastante discutido na doutrina e na jurisprudência
diz respeito ao assédio praticado por professor contra aluno, sendo de se
destacar que recentemente a sexta turma do STJ entendeu configurado
o assédio em uma relação deste tipo. 4
A segunda questão diz respeito à insuficiência da definição penal
para enquadrar o assédio sexual em relação ao direito do trabalho, pois
limita de modo indevido o espectro da violência, que pode ser praticada
quando se está em um mesmo nível hierárquico no que diz respeito
ao trabalho, valendo-se, porém, de uma outra hierarquia presente em
nossa sociedade: a condição de homem (DINIZ, 2015). Desta forma,
trabalhadoras que sofrem com ofensas sexuais indesejadas de colegas
de trabalho de mesma hierarquia estão desprotegidas pela lei penal, e,
em certa medida, também pelo direito do trabalho, que permanece sem
uma definição normativa do que é assédio sexual.
Embora o assédio possa partir de homens e mulheres e possa
também atingir homens e mulheres, o que se observa na prática é uma
dinâmica segundo a qual os homens ocupam com muito mais frequência
o papel de assediadores, e as mulheres figuram como vítimas, em especial
as negras. A população LGBTQ+ também é considerada grupo vulnerável.
5
Nesse sentido, vale observar que a homofobia está profundamente
ligada à misoginia; homossexuais masculinos se veem discriminados
sobretudo quando deixam de performar o ideal de masculinidade, ou
seja, quando abrem mão de uma condição supostamente superior para
se igualar às mulheres; mulheres lésbicas, por sua vez, são hostilizadas
em razão sobretudo de ferirem, com sua recusa à heterossexualidade,
o orgulho masculino, não sendo incomuns manifestações que tentam
“corrigir” a orientação supostamente defeituosa de mulheres lésbicas
(denominada comumente de estupro corretivo, quando assume caráter
de violência sexual). O assédio, desse modo, surge como mecanismo
4 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1759135/SP, Rel. Ministro Sebastião Reis
Júnior, Rel. p/ Acórdão Ministro Rogério Schietti Cruz. Sexta Turma. Julgado em 13.08.2019,
publicado DJe 01.10.2019.
5 Em nossa pesquisa, deparamo-nos com o caso de uma mulher assediada sexualmente por outra.
O relato encontra-se na dissertação de mestrado de Mariluc Stela Passos de Souza, intitulada
“Mulheres vítimas de assédio sexual: dez mulheres, dez histórias”. Universidade do Minho (Braga,
Portugal), outubro de 2018.
Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 151-182, jan./jun. 2020