Page 164 - REVISTA DO TRT3 Nº 101
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          muitas vezes estratégias de sobrevivência que podem ser confundidas
          com  consentimento.  A aceitação  de uma  situação  para  não  perder o
          emprego, por exemplo, não pode ser confundida com o consentimento.
          Vale ressaltar que impera ainda, no imaginário social, a ideia de que
          a mulher sempre tenta se esquivar, ainda que deseje os atos sexuais,
          ou seja, “quando diz não, no fundo quer dizer sim”, de modo que sua
          palavra pouco ou nada vale.
               É preciso compreender que, como anota Saffioti (2019), o fato de
          uma mulher ser vítima de uma violência não significa necessariamente
          que  ela  seja  passiva.  Diversas  incompreensões  sobre  a  dinâmica  das
          violências  fazem  parecer  que  a  mulher  é  cúmplice,  no  entanto,  para
          desempenhar  esse  papel,  ela  teria  que  se  situar  no  mesmo  patamar
          que seu parceiro na estrutura de poder. Somente assim ela estaria em
          condições de efetivamente consentir com a violência.
               Como  assinala  Bandeira  (2009),  não  se  trata  de  adotar
          perspectiva vitimizadora, mas de destacar que há um tipo de violência
          que historicamente vem sendo exercido contra os corpos femininos
          e que existe em decorrência da assimetria das relações de poder que
          permeiam o cotidiano.

               III O ASSÉDIO NOS TRIBUNAIS TRABALHISTAS


               Embora o Tribunal Superior do Trabalho estime que um caso de
          assédio sexual chegue à justiça trabalhista a cada hora no Brasil (GLOBO,
          2018),  o  país  não  dispõe,  ainda,  de  pesquisas  amplas  sobre  assédio
          sexual no trabalho. Existem, todavia, pesquisas acadêmicas qualitativas
          que retratam o silêncio das vítimas perante as instâncias oficiais; poucas
          são  as  que  buscam  reparação.  Diniz  (2011)  lista  alguns  fatores  que
          explicam  a  subnotificação  e  o  baixo  índice  de  denúncias  relativas  ao
          assédio sexual: medo da demissão, medo de retaliação, com atitudes
          como transferência, rebaixamento, medo de serem expostas ao ridículo
          perante colegas e família, medo de o empregador lhe negar referências,
          além do próprio medo de falar. A autora afirma, ainda, que, em suma,
          a  causa  determinante  para  o  silêncio  é  a  própria  desigualdade  entre
          os  gêneros,  que  naturaliza  a  opressão  e  a  subordinação.  Além  disso,
          menciona a tolerância que uma parte da sociedade demonstra no que




                Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 151-182, jan./jun. 2020
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