Page 162 - REVISTA DO TRT3 Nº 101
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que utiliza o sexo como instrumento de controle e poder e constitui
mais um fenômeno de natureza estrutural do que um mero desvio de
comportamento individual (DIAS, 2008).
A subordinação das mulheres, portanto, ocorre tanto no plano
organizacional quanto sexual. Deste modo, tem-se como equivocada ou,
no mínimo, incompleta a definição legal, uma vez que, mesmo diante da
inexistência de ascendência hierárquica, o assédio é possível (exemplo:
assédio entre colegas). A subalternidade não estaria inscrita somente no
âmbito dos quadros de carreira ou dos organogramas da empresa, mas
no sexismo reinante na sociedade, não se podendo olvidar, ainda, das
questões de raça e classe (DINIZ, 2015).
Uma prova de que o assédio não depende necessariamente da
hierarquia organizacional, havendo forte componente sexista, é a
ocorrência de assédio partindo até mesmo de um subordinado, fato
reportado na construção civil, com encarregado de obra assediando
arquiteta (OLIVEIRA; SILVA NETO, 2018). Embora nesse caso o encarregado
tenha sido demitido, episódios como esse mostram o quanto os homens
se sentem seguros para promover o assédio em função de sua condição
de gênero, mesmo diante da ausência da hierarquia funcional.
Importante observar também que, embora o assédio definido na lei
somente se configure mediante constrangimento, a doutrina trabalhista
reconhece dois tipos básicos de assédio: o que ocorre com base em
chantagem (conhecido como quid pro quod), no qual o assediador
promove um jogo de troca de vantagens por favores sexuais, e o que
se dá por meio da promoção de um ambiente baseado na intimidação,
caracterizado por comportamentos de incitação sexual inoportuna,
solicitações e outras manifestações de conteúdo sexual, que possuem
o efeito de criar situações hostis, ofensivas e abusivas (BARROS, 1995).
Dias (2008) registra que foi a partir de 1985 que a justiça norte-americana
passou a distinguir o assédio quid pro quod do assédio ambiental.
Um percurso pela jurisprudência e pela doutrina trabalhista
mostra que alguns entendem que deve ser aplicado o conceito legal
de assédio, previsto no Código Penal, enquanto outros entendem que
a configuração no âmbito trabalhista não se restringe ao exame dos
pressupostos contidos na lei.
Uma vez exposta a definição legal, podemos questionar quais
os atos que, na prática, indicam o assédio sexual. Hirigoyen (2015)
Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 151-182, jan./jun. 2020