Page 194 - REVISTA DO TRT3 Nº 101
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          mais,  o  fenômeno  se  verifica  em  vários  níveis  de  emprego,  porém  se
          agrava  com  intensidade  quando  relacionado  a  cargos  mais  modestos,
          devido à dependência econômica e vulnerabilidade (CUNHA, 2011, p. 13).
               A categoria das trabalhadoras domésticas, desprezadas socialmente
          e precarizadas legalmente, está entre as principais vítimas do assédio
          sexual.  Ao  analisar  esse  dado,  é  essencial  considerar  que,  conforme
          exposto, no Brasil a abordagem também precisa contemplar a questão
          racial. Nas palavras de Hildete Melo, “[...] no Brasil as negras passaram
          diretamente da senzala para o trabalho doméstico.” (MELO, 1998, p. 08),
          resquícios que o legado da escravidão anuiu a essas mulheres.
               A cultura do estupro se faz presente desde o tempo da escravidão.
          O  assédio  contra  empregadas  domésticas  histórica  e  diametralmente
          viola o direito das trabalhadoras à segurança no trabalho, cria condições
          prejudiciais ao seu bem-estar físico e psicológico e interfere no âmbito
          de trabalho ao concretizar uma atmosfera que fragiliza e desmoraliza
          a mulher, infligindo a ela a sujeição e um sistemático rebaixamento de
          direitos e limites morais.
               O  patrão  assediador  utiliza-se  do  espaço  de  convivência  e  da
          confiança  que  se  estabelece  -  quer  pelos  laços  de  afinidade,  quer  a
          partir das relações de subordinação. Revestido de crenças machistas e
          patriarcais, o empregador se sente protegido pela inviolabilidade do lar e
          se vê no direito de dispor dos corpos das trabalhadoras, principalmente
          adolescentes e jovens.  A agressão sexual é sórdida e clandestina, pois
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          o seu autor age em lugares fechados, longe de testemunhas, para não
          ser identificado.
               A  maior  dificuldade  hoje  enfrentada  para  a  detecção  do
          assédio sexual entre as trabalhadoras domésticas está justamente na
          invisibilidade  da  violência.  Não  há  dados  governamentais  estatísticos
          específicos sobre o tema. Se não há dados, significa que não há crime?
          Como lidar com um problema que não é registrado? Por outro lado, a
          mídia tem colaborado, mesmo que timidamente, uma vez que se sabe



          11    Segundo conteúdo disponibilizado pela pesquisa “O trabalho infantil doméstico no Brasil”, divulgada
            pelo IBGE em maio de 2013, trouxe números alarmantes: cerca de 258 mil crianças e adolescentes
            (entre  cinco  e  17  anos)  ainda  estavam  ocupados  no  trabalho  infantil  doméstico  no  Brasil,  em
            condições precárias de salário, dentre tanto outros dados que apontam todos os dias as barbáries da
            precarização do trabalho feminino. IBGE, O TRABALHO INFANTIL DOMÉSTICO NO BRASIL Avaliação a
            partir dos micro dados da Pnad/IBGE (2008-2011). Divulgada pelo IBGE em maio de 2013. Disponível
            em: encurtador.com.br/lvx78. Acesso em: 05 ago. 2020.


                Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 183-215, jan./jun. 2020
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