Page 196 - REVISTA DO TRT3 Nº 101
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Nessa esteira, o empregador, detentor dos meios de produção, ao
firmar um contrato de trabalho com seu empregado, faz surgir um dos
efeitos próprios desse instrumento: o poder empregatício. Nas variadas
facetas que possui, tal poder agrupa um conjunto de características com
imenso peso socioeconômico e que irão favorecer, via de regra, a figura
do empregador. Desse modo, este adquirirá maior influência no âmbito
do contrato e, inclusive, da própria sociedade.
Levando isso em consideração, é possível propor uma reflexão
mais abrangente e aprofundada sobre a questão do assédio sexual
que, como já visto, é mais um dos vários problemas que as mulheres,
infelizmente, vivenciam no mercado de trabalho brasileiro. Problema
este, aliás, antigo e generalizado.
A legislação trabalhista é silente sobre o tema. Tem-se que sua
prática configura crime em nosso país, com previsão no art. 216-A do
Código Penal, que traz:
Constranger alguém com o intuito de obter vantagem
ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da
sua condição de superior hierárquico ou ascendência
inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. Pena
- detenção de 1 (um) a 2 (dois) anos. [...]. (BRASIL, 1940).
Vale mencionar que o aludido tipo penal apenas foi criado em
maio de 2001, através da Lei n. 10.224, em correção à anomia existente
no ordenamento jurídico nacional.
Em suma, o assédio pode ser conceituado como o comportamento
que visa a explorar uma intenção sexual não recíproca da outra parte e
que se perpetua mesmo após a negativa (PAMPLONA FILHO, 2001, p. 122-
123). Verifica-se que é essencial a presença de alguns elementos para
a sua caracterização: sujeitos que se vinculam a um mesmo ambiente;
existência de um poder hierárquico na relação entre as pessoas; conduta
com conotação sexual do(a) assediante; rejeição em relação àquela
conduta do(a) assediado(a); reiteração de condutas indesejáveis -
embora haja o predomínio jurisprudencial do entendimento de que uma
única manifestação grave do(a) assediante caracteriza o tipo penal, de
maneira a se proteger o(a) assediado(a). 13
13 Aqui, por escolha metodológica relativa ao recorte do artigo, passa-se ao largo de qualquer discussão
relativa ao assédio sexual ser configurado apenas quando cometido por pessoa de sexo diverso ou se
é possível sua caracterização quando a conduta for praticada por pessoa do mesmo sexo. Até mesmo
porque não há qualquer limitação legal a respeito, ou seja, independe a verificação do sexo dos envolvidos.
Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 183-215, jan./jun. 2020