Page 202 - REVISTA DO TRT3 Nº 101
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De outra sorte, o Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande
do Sul (TRT4) reconheceu a necessidade de se atribuir valor maior à
palavra da vítima:
DANO MORAL. ASSÉDIO SEXUAL. PROVA. A prova
acerca da configuração de assédio sexual é uma das
mais difíceis de ser produzida, já que envolve uma
situação que, em regra, ocorre de forma velada,
sem a presença de testemunhas. Por esse motivo, a
melhor jurisprudência e doutrina aponta que, nessas
hipóteses, há que se atribuir considerável relevância à
palavra da vítima, especialmente quando confirmada
por outros elementos probatórios, ainda que indiretos.
Não há como se exigir a existência de depoimentos de
pessoas que presenciaram os fatos, portanto. Caso em
que há elementos suficientes a indicar a ocorrência de
assédio sexual. (TRT-4, Proc.: 00213165420155040019
(RO), Disponibilização: 25.04.2018. Órgão Julgador:
Primeira Turma. Relator: Manuel Cid Jardon.)
Essa saída jurídica é mais aceitável que as anteriores; contudo, pode
levar a decisões imprecisas, devido às volatilidades e particularidades de
cada caso concreto. Por isso, o último tópico do presente artigo científico
se ocupa de apontar bases probatórias sólidas à questão.
Antes de adentrar em minúcias, tendo tais questões à mesa,
é necessário retomar a temática do poder empregatício advindo do
contrato de trabalho firmado. Um dos desafios hoje postos ao direito
do trabalho é justamente o da limitação ao exercício desse poder, tendo
em conta as transformações pelas quais o trabalho contemporâneo
vem passando. Na era da gig economy e da “sociedade de controle” ,
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17 Expressão do filósofo Gilles Deleuze, que colocou a sociedade de controle como aquela que ascendeu
ao fim da sociedade disciplinar de Foucault, o que, segundo ele, deu-se a partir da segunda metade
do século XX. Seria marcada pela interpenetração dos espaços, por sua suposta ausência de limites
definidos (a rede) e pela instauração de um tempo contínuo. Haveria uma espécie de modulação
constante e universal que atravessaria e regularia as malhas do tecido social. “Não há necessidade de
ficção científica para conceber um mecanismo de controle que forneça a cada instante a posição de
um elemento em meio aberto, animal numa reserva, homem numa empresa (coleira eletrônica). Félix
Guattari imaginava uma cidade onde cada um pudesse deixar seu apartamento, sua rua, seu bairro,
graças ao seu cartão eletrônico, que removeria qualquer barreira; mas, do mesmo modo, o cartão
poderia ser rejeitado tal dia, ou entre tais horas; o que conta não é a barreira, mas o computador que
localiza a posição de cada um, lícita ou ilícita, e opera uma modulação universal.” Cf. DELEUZE, Gilles.
Pourparlers. Paris: Les Éditions de Minuit, 1990.
Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 183-215, jan./jun. 2020