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no início do item “III.2” da fundamentação desta sentença, a penetração
dos fatos no mundo jurídico dá-se em uma ordem de análises que é
estabelecida pela própria ordem jurídica.
Afinal, ao operador do Direito a simples leitura dos fatos
estabelecidos no item anterior (e que são, todos, incontroversos) já seria
suficiente para provocar candentes conclusões acerca do que certamente
não seria a natureza jurídica da relação existente entre Autor e Ré - que,
então, já poderiam ser enumeradas de imediato.
Tal provocação, porém, deve ser contida: não se pode transpor,
para o Direito, a regra algébrica de que a ordem dos fatores não interfere
na soma, pois a própria ordem jurídica já impõe a correta ordem de
análise, que parte das normas de maior especialidade (leis especiais) em
direção às mais ordinárias (leis comuns). Afinal, conforme se depreende
do § 2º do art. 2º do Decreto-Lei n. 4.657/1942, é essencial que se avalie
se determinada relação jurídica não está sujeita a uma norma que a reja
com especialidade, para que, só então, possa-se buscar sua regência em
normas gerais. Assim também é esclarecido pelo jurista Paulo Emílio
Ribeiro de Vilhena em sua obra “Relação de emprego: estrutura legal e
supostos” (1. ed. São Paulo: Saraiva, 1975):
Da lei geral, que é lei comum, distingue-se a lei especial,
que se destina a regulamentar situações e relações
de pessoas não compreendidas, em seus efeitos e na
intensidade da tutela, no ilimitado campo da primeira.
Ensina-se, com admissível propriedade, que a lei
singular como a lei especial retiram ao direito geral,
relações jurídicas, para imprimir-lhes efeitos diferentes
e tutelá-Ias segundo princípios jurídicos que não se
compatibilizem com aqueles visados no direito geral.
(VILHENA, 1975, f. 39).
O direito especial não cinde a estrutura do ordenamento
nem lhe quebra a harmonia geral. Quando aplicado,
seus princípios e regras têm primazia sobre as regras e
princípios de outras disciplinas. (VILHENA, 1975, p. 40).
Só assim, não se comete o erro comum do enquadramento
prematuro de toda relação jurídica, mormente as contratuais, na vala
comum regrada pela lei comum - onde sempre se enquadrarão, ainda
que em pequena extensão, justamente porque a lei comum é a que
prevê o regramento mais genérico para as relações.
Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 479-576, jan./jun. 2020