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o autor era ainda magistrado), a ocorrência de qualquer proposição
hermenêutica que se faça em um ponto da obra e que venha mais
adiante a se conflitar com outra, ou com a realidade da vida (sobre a qual
opera todo o direito), ou outra inconsistência que tenha sida revelada
por modelo distinto, que tivesse tentado fundar bases hermenêuticas
para a compreensão de toda e qualquer relação de emprego, quaisquer
que fossem os fatos específicos de cada um dos casos que já se tivesse
apresentado ou se viessem a apresentar.
Nota-se, ainda, o alinhamento do modelo teórico que, nessa 1ª
edição, em específico, é explicitado por Vilhena (e tantos demais juristas)
aos princípios adotados nas obras jurídicas consideradas clássicas - no
sentido de essenciais e atemporais -, que se nortearam pelo maior salto
evolutivo da história da ciência jurídica, ocorrido já ao final do século XIX,
quanto ao consenso de que uma relação jurídica se desenvolve somente
entre sujeitos, e que estes sujeitos, quaisquer que sejam, somente se
subordinam à ordem jurídica.
Conquanto tal marco da ciência jurídica já se tenha estabelecido
há mais de um século, por vezes, parece ter-se perdido em uma
pequena parcela da doutrina e da atuação técnica contemporânea,
que, inadvertidamente, ainda se permitem enganar pela ilusão da
possibilidade de relações entre sujeito e objeto, ou da objetificação de
sujeitos nas relações com outros, através da subordinação real (sujeição
pessoal) entre pessoas, ainda que alguma destas seja o próprio Estado.
Para que melhor se esclareça esse avanço, é fundamental visitar
outra obra essencial do mesmo jurista, “Direito público, direito privado:
sob o prisma das relações jurídicas” (2. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1996),
em que Paulo Emílio Ribeiro de Vilhena faz uma distinção basilar, mas
nem sempre observada na ciência jurídica, entre Estado-ordem-jurídica
e Estado-sujeito-de-direito, ambos faces distintas do Estado, enquanto
aglutinador do poder público.
Este poder é reunido e coordenado (redistribuído) pelo Estado
enquanto sujeito-de-direito (que são as instituições do Estado, que
existem para administrá-lo, e para dar eficácia à ordem jurídica, dentro
do poder-dever que esta impõe aos agentes de tais instituições),
mas tal reunião e redistribuição de poder se dão sempre nos moldes
determinados pelo Estado enquanto ordem-jurídica (a norma jurídica -
que pode permitir, proibir, ou simplesmente não obstar a autonomia da
vontade das partes).
Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 479-576, jan./jun. 2020