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que, ao final da análise jurídica, órgão judicial brasileiro conclua o non
liquet, ou seja: que a relação analisada interessaria ao direito (seria
jurídica), mas seria insulada de qualquer efeito deste, inclassificável em
qualquer item acima, de “1” até “4”, a ponto de ser infensa à ordem
jurídica por sob a qual opera - como seria o hipotético caso, por exemplo,
de se concluir que a interação existente entre Autor e Réu represente uma
nova modalidade econômica tão alienígena ao Direito que nada restaria
ao Judiciário senão paralisar-se diante de tamanha extravagância.
Estabelecidas, portanto, pela ordem jurídica nacional a ordem de
análise das hipóteses e a impossibilidade do non liquet na investigação
da natureza jurídica de uma relação (e seus respectivos efeitos), passa-se
a realizar esta investigação:
III.4 - Hipótese da natureza jurídica de relação de trabalho
empregatícia
III.4.a) A adoção do modelo teórico adequado para a análise
acerca da natureza empregatícia da relação jurídica
No percurso da análise técnica desta hipótese jurídica, é importante
que se explicite, de início, a adoção de determinada base hermenêutica
doutrinária. Diz-se adoção, e não “escolha”, pois, tratar o Direito como
ciência é compreender que não há a livre possibilidade de escolha entre
múltiplos modelos teóricos, como se todos solucionassem, por igual, o
mesmo problema (o mesmo “fenômeno”).
Uma teoria supera a outra quando explica melhor a realidade do
que aquela que superou, denotando menos contradições internas e
externas que a teoria superada - que, à medida que passa a ter suas
contradições expostas pelo novo modelo, revela-se mais insuficiente e
inadequada para a solução dos problemas desta realidade.
Conquanto isso pareça evidente, por exemplo, nas ciências
médicas ou aplicadas, a austeridade na escolha e justificação de um
modelo teórico ainda não parece estar sendo considerada tão relevante
no Direito nacional, cuja parte da doutrina satisfaz-se em catalogar
“correntes” (na verdade, hipóteses) sem a reflexão das fraquezas destas.
Tais hipóteses passam, então, a ser escolhidas e utilizadas por seus
operadores tais quais produtos em uma prateleira de supermercado,
como se isso não tivesse maiores consequências materiais para a
Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 479-576, jan./jun. 2020