Page 504 - REVISTA DO TRT3 Nº 101
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Ao posicionar o Estado-ordem-jurídica num plano superior, não só
em relação aos indivíduos, mas também em relação ao próprio Estado
enquanto sujeito-de-direito (e seus respectivos agentes), Vilhena faz
mais um esclarecimento que pode parecer óbvio, mas que, infelizmente,
é por vezes esquecido até mesmo pelos operadores do Direito do
Trabalho, para quem o conceito de “subordinação” é tão caro: no Estado
Democrático de Direito, os sujeitos de uma relação jurídica (seja pública
ou privada) jamais se subordinam, entre si, apenas se relacionam.
Ambos, porém, subordinam-se à norma, que cria e rege estas
relações (portanto, jurídicas):
Não por outras razões sustentam Nawiasky e Kelsen,
com toda propriedade, que existe subordinação (jamais
será exaustivo repetir) à norma jurídica. [...] Jamais
alguém obriga ou se obriga. Obrigar pode, apenas, a
ordem jurídica. (VILHENA, 1996, p. 105.)
Geralmente, nas relações jurídicas de direito privado, o
Estado está presente como ordem jurídica, inoculando,
na vontade dos indivíduos, a vontade da norma,
para assegurar determinada eficácia ou cortá-la em
inúmeras situações de modo diverso por eles dispostas.
(VILHENA, 1996, p. 93.)
Portanto, num Estado de Direito, é grave erro tomar
como válida, do ponto de vista jurídico, a possibilidade da
subordinação pessoal, “a dominação de indivíduo sobre
indivíduo (Person über Person)”. (VILHENA, 1996, p. 47.)
Não é excessivo reforçar que, no Estado Democrático de Direito,
os indivíduos não se subordinam, sequer, ao Estado-sujeito-de-direito,
mas somente ao Estado-ordem-jurídica. Ao contrário: a sujeição
de indivíduos ao Estado-sujeito-de-direito costuma ocorrer apenas
em regimes antidemocráticos (fenômeno que Vilhena denomina
interpolação alternativa).
Assim, seja entre os indivíduos, ou entre estes e o Estado-
sujeito-de-direito, não se deve cogitar subordinação, apenas nas
relações - relações estas que o Estado-ordem-jurídica pode, enquanto
expressão da vontade de seu povo, decidir por subordinar ou não a
determinado regime legal.
Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 479-576, jan./jun. 2020