Page 511 - REVISTA DO TRT3 Nº 101
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consumidores de uma pessoa jurídica, é-nos indiferente o nome de
seus trabalhadores, talvez nunca sequer venhamos a sabê-los, pois, em
regra, não criamos relações com eles. Quem se preocupa com o nome
destes trabalhadores é apenas o empregador destes - não porque sejam
pessoas “insubstituíveis”, mas porque este empregador, simplesmente,
necessita que sejam singularmente identificáveis, para saber quem
prestou a atividade pela qual ele paga e se a prestou bem ou mal.
III.4.d) A natureza da atividade econômica da Ré, Uber do
Brasil, e requisito da prestação serviços de “natureza não eventual a
empregador” por parte do Autor
É sedutora a proposta hermenêutica de que a prestação de
“serviços de natureza não eventual a empregador” diga respeito à
pessoa do empregado, numa perspectiva “temporal” da Física, a ciência
que melhor estuda o “tempo” (e que, em geral, é melhor compreendida
pelos físicos que pelos juristas).
O acolhimento apressado desta proposta hermenêutica evitaria,
aqui, maior esforço analítico. Afinal, o suporte fático, explorado no item
“III.1.A” acima, não deixa dúvidas de que, numa perspectiva temporal,
o Autor trabalha de forma contínua para a Ré há cerca de 4 anos, sendo
que, desde que iniciou seu trabalho, em 02.03.2016, faz viagens com
regularidade, cerca de 300, a cada mês, em média (ou seja, há meses
em que realizou mais, outros, menos), conforme demonstram os
documentos anexados pela própria Ré, de f. 573 à 1.311.
Porém, o caminho fácil da perspectiva subjetiva com foco no
motorista, e na “temporalidade”, não permite uma coerência mínima,
para que seja juridicamente aceitável. Afinal, não há qualquer óbice para
que se forme contrato de emprego com uma pessoa que trabalha um dia
a cada semana, por anos a fio, para outrem. Tampouco, com uma pessoa
que trabalhe direto, por apenas uma ou duas semanas, antes que seu
contrato seja rescindido, por iniciativa própria ou de seu empregador.
Se alguma destas perspectivas ”temporais” se tivesse feito suposto
essencial, para que se estabelecesse a relação de emprego, seriam, então,
nulos tais contratos? E, neste modelo teórico da não eventualidade sob
a perspectiva “temporal”, qual seria, objetivamente, a contagem do
intervalo (ou da regularidade?) de tempo, que estabelecesse suporte
fático suficiente para o reconhecimento da relação de emprego? Se pelo
Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 479-576, jan./jun. 2020