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(“Lei do Uber”), se ele não transportar os passageiros através de
empresas como a Ré.
Este motorista poderá atender a todos os demais requisitos da
citada lei, e ainda será um contraventor: pode manter seguros DVPAT
e APP em dia, inscrever-se como contribuinte do INSS, ser habilitado
em categoria B ou superior que contenha a informação de que exerce
atividade remunerada, emitir e manter CRLV, portar certidão de
antecedentes criminais - e mesmo cumprindo simultaneamente todas
estas obrigações (algumas delas comuns a todo e qualquer motorista),
se o transporte remunerado do passageiro não for por ele realizado
através de empresas como a Ré, este motorista estará praticando uma
atividade ilegal, nos termos do citado dispositivo do CTB, e do parágrafo
único do art. 11-B da Lei n. 12.587/2012, conforme redação dada pela
Lei n. 13.640/2018 (“Lei do Uber”).
A ciência jurídica não se impressiona com eufemismos, merecendo
ser repetida a lição de Pontes de Miranda:
Não há dúvida que viola a lei o que, rodeado pelas
palavras da lei, se esforça contra a vontade da
lei: e não evitará as penas insertas nas leis quem,
fraudulentamente, por esquerda prerrogativa de
palavras, se escusa contra o sentido do direito.
(MIRANDA, Tomo I, 2012, p. 89.)
Ao alegar que não exerce a atividade de transportes, a Ré confia
na incapacidade do operador do Direito em diferenciar “empresa” da
“pessoa jurídica” que a exerce, seja pela ótica do art. 2º da CLT, ou do
art. 966 e seguintes do CCb, que já esclarece ser ela a “[...] atividade
econômica profissionalmente organizada para a produção ou a circulação
de bens ou de serviços.”
A pessoa jurídica da Ré, de fato, não transporta, “pessoalmente”,
um passageiro de um local para outro, exatamente da mesma forma que
também não o fazem todas as demais pessoas jurídicas de quaisquer
outras empresas de transportes urbanos, aéreos, marítimos ou
rodoviários do Brasil e do mundo. Todas estas pessoas jurídicas apenas
organizam a atividade econômica de transportes, e quem a realiza,
pessoalmente, são os motoristas, os pilotos, armadores e tripulantes
empregados, conforme já concluído no item “III.4.c”, acima.
Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 479-576, jan./jun. 2020