Page 522 - REVISTA DO TRT3 Nº 101
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(hardware) e programas (softwares) de rede para o mercado (ou seja, para
outrem). Ela não se sustenta disso.
O mercado não a remunera por isso, porque ela simplesmente
não presta tal atividade para o mercado. A Ré é remunerada pelo
passageiro, somente - que adquire transporte, e não tecnologia de rede
(que nunca se perca de vista este fato, embora óbvio!). A ordem jurídica
não impede, então, que a ampliação ou modernização da estrutura
tecnológica de sua rede seja contratada nos termos do art. 593 ou 610
do CCb - ou até mesmo terceirizada para outra pessoa jurídica, o que é
o que, realisticamente, ocorre. Não há sequer necessidade, aqui, de se
prosseguir na análise da onerosidade ou subordinação.
Diferente situação, porém, é a da permanente manutenção de
sua rede, em face das particularidades da operação por ela organizada,
que imponham permanente necessidade de pessoas que exerçam
determinada atividade. Ou até outro exemplo, ainda bem mais evidente:
a manutenção e aperfeiçoamento de seu software, o aplicativo chamado
“Uber” (que, repita-se, embora óbvio, que não é uma empresa, e sim um
modelo de organização patenteado, que pertence a uma empresa, a Ré):
se a Ré contrata pessoas para fazê-lo, estará contratando pessoas para
atuar em uma atividade de necessidade permanente em sua organização
de serviços. E, para a CLT, pouco importa se, do ponto de vista destas
pessoas, a atividade se dê de forma “contínua” ou “intermitente”, o que
importa é que, do ponto de vista da Ré, isto é uma necessidade não
eventual dela.
Insiste-se, então, em não se focar na continuidade, do ponto de
vista do empregado, especialmente quando o § 3º do art. 443 da CLT já
esclarece, expressamente, que isso é irrelevante para o reconhecimento
da relação de emprego, sem que isso tivesse revogado ou alterado os
supostos que sempre existiram nos arts. 2º e 3º da CLT.
Afinal, a realidade da vida é essa: a necessidade permanente de uma
atividade da Ré pode perfeitamente ser atendida de forma intermitente
pelo conjunto dos empregados que lhe prestam atividade, justamente
porque ela não depende de um empregado só, mas de todo o conjunto
dos empregados que prestam esta atividade ainda que intermitente
- o que revela, ainda, outra armadilha do modelo subjetivista: a de
pensar que, porque a relação de emprego ocorre individualmente entre
empregado e empregador, deva-se pensar na atividade do empregador
como dependente de uma relação entre duas pessoas (o contratante e o
Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 479-576, jan./jun. 2020