Page 534 - REVISTA DO TRT3 Nº 101
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passageiro. O motorista que prefira comportar-se como um autônomo,
aplicando seus próprios padrões de atividade (ex.: cobrar a mais pela
corrida, distribuir cartões com seu telefone aos passageiros, recusar
toda corrida que quiser enquanto estiver com o aplicativo ativado etc.),
não se encaixará na atividade da Ré, sendo permanentemente alijado,
conforme já visto.
Um dos elementos mais notáveis da organização da atividade
da Ré dá-se através da ferramenta que criou e aperfeiçoa: o aplicativo
denominado “Uber” (que leva sua parte de nome, mas com a pessoa
jurídica dela não se confunde: o aplicativo “Uber” é apenas um meio
de organização do empresário “Uber do Brasil Tecnologia Ltda.”, e não
o próprio empresário). Esta ferramenta de organização por ela criada
permite-lhe monitorar e intervir, em tempo real, na atividade do Autor.
Nas palavras da própria Ré, torna possível que ela saiba, exatamente,
onde e com quem o motorista está no carro (documento de f. 106);
e mais que isso: conforme item III.1.C, a Ré não tem acesso apenas à
localização em tempo real, a partir de mapas detalhados com posições
completas, rotas e horários (como comprova o documento de f. 34), mas
também a detalhes de como tal prestação de serviços se desenvolve,
inclusive quanto à intensidade das acelerações e frenagens que o
motorista imprime ao veículo (conforme prova de f. 33 e 35) - acerca das
quais ela faz recomendações ao motorista.
Este sistema de telemetria, que se vale dos sensores dos
atuais telefones celulares inteligentes (smartphones) aptos a rodar
o seu aplicativo, como acelerômetros, giroscópio e rastreamento de
posicionamento geográfico via GPS (que também informa a velocidade
média e a velocidade em tempo real - tudo conforme provas acima),
permite à Ré o exercício de um controle sobre o trabalho do motorista
que impressionaria até mesmo o mais fervoroso adepto da ultrapassada
teoria submissionista, tão preocupada com o irrelevante fator da
“intensidade” da subordinação e com elementos que sempre lhe foram
acessórios, como o “controle da jornada de trabalho”.
Aliás, mesmo bem antes do início das operações da Ré no mundo,
o legislador nacional já se antecipava a esta possibilidade, quando, em
2011, a Lei n. 12.511 introduziu, na CLT, o parágrafo único do art. 6º,
que assim dispõe: “Os meios telemáticos e informatizados de comando,
controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica,
aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do
Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 479-576, jan./jun. 2020