Page 545 - REVISTA DO TRT3 Nº 101
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o operador do Direito sempre se veja com maior ou menor dificuldade
para analisar um caso e estabelecer os efeitos desta relação, quando
questionado por um ou mais dos partícipes da relação.
O que se deve evitar, porém, é que desta natural dificuldade surjam
os mais graves deslocamentos hermenêuticos, em que o operador do
Direito, tendo que realizar este trabalho a mais para estabelecer os
efeitos “justos” da relação, do ponto de vista do interesse público (art.
8º da CLT), passe a transferir a sua angústia para os pressupostos desta
própria relação jurídica, a ponto de desnaturá-la.
Um dos exemplos desta inversão motivada pela angústia seria o
de se afirmar, por exemplo, que, na ausência das bases tão claramente
expostas pela Lei n. 13.467/2017, um motorista que todos os dias
aceitasse oferta de trabalho de 5 empresas que organizem sua atividade
de modo análogo ao da Ré teria direito a um salário mínimo de cada
uma - o que pareceria “injusto” ao operador do Direito desavisado -, não
porque o motorista possa ter 5 relações de emprego simultâneas (pois
nunca houve qualquer óbice legal contra isso), mas porque cada uma
delas pareceria, numa análise menos ponderada, ter o suposto efeito
de lhe gerar o direito ao recebimento de um salário mínimo integral de
cada empregador.
Leve-se às últimas consequências este pseudo-óbice, que não
é jurídico - como tampouco é jurídica a angústia em pensar que um
empregado “enriqueceria sem causa” se mantivesse vários vínculos de
atividade intermitente: mesmo antes da Lei n. 13.467/2017, o operador
do Direito já poderia, com algum esforço, utilizar-se da analogia, da
equidade e até do direito comparado, para estabelecer um efeito que
lhe parecesse mais adequado (ou “justo”) a esta relação.
Tal esforço de colmatação, porém, torna-se inexistente, a partir
da Lei n. 13.467/2017, que traz o conforto de uma resposta para
esta questão: em cada uma das 5 relações, o empregado só recebe o
proporcional ao que efetivamente trabalhou para cada um, garantido o
piso do salário mínimo apenas para cada hora completa trabalhada para
cada diferente empregador - cada um responsável apenas pelo tempo
em que o serviço lhe foi prestado.
Mesmo neste extremo exemplo hipotético (pois, no presente caso
concreto, está claro que o Autor trabalhou apenas para a Ré), não se pode
fugir da realidade da vida, no sentido de que o tempo e a capacidade de
trabalho de todas as pessoas físicas são limitados e que, ao aceitar a oferta
Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 479-576, jan./jun. 2020