Page 553 - REVISTA DO TRT3 Nº 101
P. 553

553


                    Passando  a  ter  que  avaliar,  agora,  argumento  retórico  da  Ré,
               inaveriguável apenas pela análise normativa ou doutrinária das provas
               da ação, o órgão se vê obrigado a realizar pesquisa através dos mesmos
               meios  utilizados  pelas  partes.  E  a  conclusão  desta  pesquisa  é  que
               a própria veracidade do alegado pela Ré quanto a tal questão não se
               sustenta. Ao contrário: a pesquisa realizada não somente nos veículos
               conhecidos de imprensa, mas, sobretudo, nos sítios eletrônicos oficiais
               do poder legislativo de outros países demonstra o inverso do alegado
               pela Ré - e aponta, até mesmo, para um consenso global cada vez mais
               nítido quanto ao trato da questão nos países centrais do capitalismo.
                    Conforme pesquisa realizada pelo Ministério Público do Trabalho,
               vários são os julgados de outros países (todos eles já listados às f. 192
               a 197 dos autos), como a Inglaterra, Estados Unidos, Canadá, Suíça e
               Espanha, que garantem aos motoristas da Uber efeitos semelhantes aos
               do contrato de emprego intermitente que é regrado no Brasil pela Lei n.
               13.467/2017. Neste estudo, estão listadas, inclusive, decisões expedidas
               pelas  cortes  da  Flórida e da  Califórnia,  reconhecendo  a  relação  de
               emprego,  o  que  demonstra  que  o  argumento  de  defesa  sequer  foi
               exposto  com  veracidade.  São,  enfim,  inúmeras  decisões  judiciais  e
               administrativas, expedidas em vários países do mundo, e não cabe aqui
               estender ainda mais o texto da fundamentação transcrevendo-as (basta
               que sejam consultadas de f. 192 a 197).
                    Além disso, após a conclusão do supracitado estudo do Ministério
               Público do Trabalho brasileiro, as cortes de outros países se manifestaram,
               como a França, que, de março de 2020, reconheceu, para todo aquele
               país, a relação de emprego entre a Ré e os motoristas de todo o país.
                    No  penúltimo  parágrafo,  porém,  dizem-se  efeitos  semelhantes,
               porque  não  seria  de  se  esperar  que  a  legislação  destes  países  fosse
               semelhante  à  nossa,  a  ponto  de  classificar,  na  linguagem  local,  o
               motorista como “empregado intermitente”. Na prática, porém, as cortes
               judiciais e administrativas de todos estes sete países reconheceram que
               a relação entre o motorista e a Ré é uma relação que impõe um piso
               mínimo  de  obrigações  que  todos  os  escritórios  da  Ré,  nestes  países,
               devem garantir aos motoristas - sendo elas, também, previdenciárias-,
               e  outras  resultantes  do  regramento  desta  relação,  como  o  direito  ao
               recebimento do seguro-desemprego em alguns destes países.
                    Mas não foram apenas as cortes judiciais e administrativas destes
               países,  todos  eles  centrais  ao  capitalismo,  que  estabeleceram  certos
               patamares mínimos para a prestação de trabalho dos motoristas.



                     Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 479-576, jan./jun. 2020
   548   549   550   551   552   553   554   555   556   557   558