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que pode representar uma miríade de relações sem nenhum ponto de
encontro que lhe defina alguma natureza jurídica específica.
E justamente por isso é a armadilha mais eficiente contra o operador
do Direito que não o conhece como sistema e que, desconhecendo a
ordem legal de enfrentamento das hipóteses (já explicitada no item
“III.3”), parte primeiro para a avaliação dos fatos-suporte à luz de uma
figura genérica, em vez de deixá-la por último.
Para este operador, praticamente todas as relações caberão nesta
expressão não tipificada pelo direito nacional - justamente porque dele a
expressão “parceria comercial” ainda não recebeu nenhum pressuposto
específico de caracterização.
As armadilhas de se tentar preencher o vazio jurídico antes de
se buscar a real substância não têm fim, porque o vazio jurídico gosta
de se preencher de retórica - que, além de sedutora, multiplica-se
em vários idiomas: consumo colaborativo, economia compartilhada
(shared economy), networked farms, redes peer-to-peer, gig-economia,
crowd-economia, app, marketing multinível, assets digitais, compliance,
contratos por blockchain etc.
Todas estas expressões têm poder linguístico referente sobre o
que identificam e, quando não se trata de mero neologismo (o que não
raro ocorre), podem, de fato, servir para identificar novas formas de
relações entre as pessoas e seus novos modos de atuação em um mundo
que é constantemente mudado por elas. Mesmo assim, nenhuma
destas expressões será, por si, criadora de novas naturezas jurídicas,
ou excludente das que já existem. Afinal (e retornando ao início desta
decisão), quem tem o poder de estabelecer a natureza jurídica dos fatos,
atos, coisas e relações, bem como os respectivos efeitos não é a retórica,
mas somente o povo, através do Estado-ordem-jurídica.
De tal forma que, vencida toda a ordem de enfrentamento das
hipóteses jurídicas, uma relação jurídica contratual fosse atípica, ou
seja, que não fosse de emprego, nem de trabalho em sentido lato, nem
alguma das várias outras previstas no CCb, e nem mesmo qualquer outra
regulada por alguma lei especial, ainda seria captada pela ordem jurídica
nacional no art. 425 do CCb.
Não obstante, deve-se prosseguir na investigação desta expressão
que, como visto, não é jurídica, mas empresarial: a “parceria comercial”.
Nisso, em absolutamente nada ajudam as duas espécies de parceria
de direito privado que são reguladas no direito nacional em normas
Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 66, n. 101, p. 479-576, jan./jun. 2020