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                                    Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 70, n. 110, p. 151-170, jul./dez. 2024160A incorporação de sistemas de inteligência artificial à atividade jurisdicional deixou de ser mera possibilidade conveniente para tornar-se exigência ética e funcional dos magistrados brasileiros.Como já demonstrado, não se trata de uma situação recente, tendo já em 2019 o Conselho Nacional de Justiça se atentado para a necessidade de incorporação desta tecnologia no âmbito dos processos de trabalho:Como em outros aspectos do seu cotidiano, as pessoas e as organizações têm sido atingidas pelo uso da tecnologia da informação e o ambiente judiciário não pode se furtar de também buscar novos standards, aproveitando-se das melhores soluções possíveis e do potencial de seus magistrados e servidores públicos. (2019, p. 14).Entretanto, a Resolução nº 615, de 11 de março de 2025 do Conselho Nacional de Justiça, ao disciplinar o uso de modelos de linguagem de larga escala e outras formas de inteligência artificial, desloca o debate da esfera da potencialidade para a regulamentação e institucionalização do uso das ferramentas.O art. 19 da referida Resolução (CNJ, 2025) estabelece, em seu caput, que magistrados e servidores “poderão” utilizar a inteligência artificial como ferramenta de auxílio à gestão ou de apoio à decisão, “[...] em obediência aos padrões de segurança da informação e às normas desta Resolução”.Esse verbo indicativo, à primeira vista permissivo, transforma-se em verdadeiro ônus funcional quando analisado à luz de seus parágrafos e do sistema normativo mais amplo.O § 1º do referido artigo impõe a preferência pelo acesso habilitado e monitorado pelos tribunais, suprimindo a alegação de indisponibilidade institucional, enquanto o § 2º faculta a contratação direta de solução privada quando inexistir oferta corporativa, eliminando a inércia tecnológica ou alegação de ausência de estrutura como justificativa para a recusa.A obrigatoriedade ganha densidade com o § 3º, I, que exige capacitação específica em melhores práticas, riscos e uso ético da inteligência artificial. Assim, a atualização tecnológica passa a integrar o padrão mínimo de diligência exigido do magistrado moderno.O § 3º, II reforça que a IA tem caráter estritamente auxiliar: veda-se a decisão autônoma dos modelos sem a “orientação, verificação e revisão” 
                                
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