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                                    Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 70, n. 110, p. 171-187, jul./dez. 2024179que operam com base em dados pré-carregados e podem reproduzir vieses históricos, sociais e culturais, sem a capacidade crítica de revisão ética e jurídica.Por fim, o uso de IA para proferir sentenças gera insegurança jurídica, pois essas decisões podem ser inconsistentes ou baseadas em padrões estatísticos desatualizados ou enviesados, afastando o Direito de sua função social de realizar justiça no caso concreto.Portanto, o uso da inteligência artificial não deve ultrapassar o papel de ferramenta auxiliar, sendo vedada sua utilização como substituta da atividade decisória humana, sob pena de esvaziar o sentido democrático, humanizado e ético da jurisdição.7 ENTRE A REGULAÇÃO CIVILIZATÓRIA E A CYBERCOLONIZAÇÃOA inteligência artificial e as novas formas de organização do trabalho não representam uma ruptura absoluta com o passado, mas a continuidade de um processo histórico em que o capitalismo, desde sua origem, se estrutura sobre a base da extração de valor do trabalho humano. Como bem sintetiza o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, “[...] não há trabalho humano que não tenha nascido sob a égide do conhecimento e da tecnologia”9, e é justamente essa característica que 9 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. 01ª Turma. Embargos de Declaração em Ação Trabalhista pelo Rito Ordinário. Autos 0010436-58.2022.5.03.0092. Ementa: EMPRESA-PLATAFORMA. MOTORISTA - RELAÇÃO DE EMPREGO. TRAÇO DIFERENCIADOR ENTRE O TRABALHO AUTÔNOMO E O TRABALHO SUBORDINADO - UBERIZAÇÃO E GOOGLERIZAÇÃO DA ECONOMIA - Pública e notoriamente, os motoristas de aplicativos, sob o comando de empresas-plataforma, não podem estipular o preço da corrida, nem descontos conceder, já que o valor é estabelecido pelo software delas, que ficam fechados sobre si próprios, conteúdos e “modus operandi”, sem a interferência de terceiros. Sabese, ainda, que os motoristas não possuem a plena prerrogativa de escolher os passageiros e são, continuamente, submetidos à variada gama de avaliações. Por conseguinte, se os motoristas não têm a liberdade de definir a contraprestação pelo seu trabalho, obedecendo, por outro lado, às rígidas e múltiplas regras relacionadas com as condições do veículo, com a aparência, com o comportamento e com o desempenho, ainda que por intermédio de um sistema eletrônico, inclusive com a participação do passageirocliente, configurada está a subordinação, que admite, na sociedade informacional, variadas formas de configuração, mesmo que pela “mão invisível” de aplicativos. Na lição dos Profs. Cláudio Jannotti da Rocha e Edilton Meireles, “Presencia-se um momento de enorme disrupção econômica, trabalhista, relacional, ambiental de grandes e profundas reformulações conceituais e estruturais que estão emergindo a cada dia e que convergem 
                                
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